05 abril 2006

Gagueira e Deficiência

A questão de considerar a gagueira como uma deficiência é uma grande polêmica entre as pessoas que gaguejam. Alguns que possuem uma gagueira mais severa e/ou que já se sentiram prejudicados em alguma prova oral e/ou concurso público, tendem a pensar, ver e sentir a gagueira como uma deficiência. Por outro lado, os que conseguiram transcender as dificuldades comunicativas, mas que de uma forma ou outra ainda gaguejam, são completamente contra a inclusão da gagueira no rol das deficiências fisicas legalmente reconhecidas.

Inclu-o me no segundo grupo. Não considero a gagueira como uma deficiência física. Creio que a gagueira do desenvolvimento é uma espécie de comportamento adquirido. Toda criança apresenta, em suas idades mais remotas, alguma dificuldade no amadurecimento da fala. Porém, o meio ambiente vivido e alguma predisposição genética levaram alguns a desenvolverem a gagueira sofrimento. A partir deste sofrimento, aspectos emocionais, comportamentais e psíquicos foram sendo criados no cérebro do indivíduo, de maneira que induziu este órgão a considerar aquelas informações como "normais". Reprogramar o cérebro em relação à fala, não é nada simples. Principalmente se o indivíduo pensa de tal maneira durante décadas. Mas existe tratamento adequado.

Querendo discutir esta questão, publico aqui algumas palavras da respeitada fonoaudióloga Ana Maria, de Brasília-DF, onde ela nos relata uma situação de um paciente que sentiu-se despretigiado em um concurso público e pretendia recorrer da situação baseando-se no Decreto Nº 3.298. Além do mais, a fonoaudióloga nos compartilha uma nota, publicada em Correio Braziliense, na qual uma leitora questiona um Procurador da Fazenda sobre a questão dos concursos.

Quem desejar debater e ter o seu texto aqui publicado, é só deixar um comentário com endereço eletrônico que entrarei em contato.

As palavras da Fonoaudióloga Ana Maria:


Outro dia fui procurada para analisar o Decreto Nº 3.298, de dezembro de 1999, pois o paciente se sentia prejudicado num processo seletivo em uma empresa privada. Passou em todas as provas objetivas e práticas, porém foi reprovado na entrevista e dinâmicas de grupo. Segundo ele, o motivo da reprovação era o seu desempenho comunicativo por causa da falta de fluência. Apesar de achar isso não tinha subsídios para provar que a gagueira o desclassificou.

Como pretendia prestar concurso público soube deste decreto e queria pleitear uma vaga como deficiente, porém, precisava de um laudo de um profissional da área para provar que se enquadrava nos parâmetros da deficiência do decreto.

Informei-o que a gagueira não se enquadrava no que é considerado deficiência pelo decreto, pois a referência que se faz a comunicação é nos casos de deficiência mental que compromete todo o desenvolvimento do indivíduo, inclusive suas habilidades comunicativas. Logo, a gagueira não estaria enquadrada e ele não poderia concorrer a essas vagas reservadas.

Na mesma semana saiu no jornal uma nota de um advogado respondendo a um questionamento de uma pessoa que gagueja sobre o assunto. Esta nota transcrevo abaixo:

"Eu sou gaga, em algumas situações a minha fala é muito ruim. Gostaria de saber se esse problema poderia ser alegado como falta de capacidade para o exercício de cargo público em que seja necessário o atendimento ao público. Já existe algum caso semelhante a esse na jurisprudência brasileira?”

A gagueira é normalmente considerada uma disfunção da fala. A gagueira é, na verdade, uma condição extremamente complexa que envolve mais do que a repetição das palavras, prolongamentos das sílabas e outras "disfunções" da fala. A gagueira afeta a pessoa como um todo e é mais adequadamente descrita como uma combinação de disfunções de fala, comunicação e comportamento. Por outro lado, a investidura em cargo público pressupõe como requisito básico a aptidão física e mental. Entendo que a gagueira por si só não deve ser tida com óbice para tal investidura, ainda mais porque seria necessária previsão legal para tanto, o que desconheço. Assim sendo, em uma hipótese remota de ocorrer desclassificação no concurso em face de tal distúrbio, entendo que seria plenamente o ajuizamento de uma ação no sentido de coibir tal abuso."


Correio Braziliense, Guia de Concursos, 12/02/2006.
Resposta dada pelo Procurador da Fazenda Nacional Leonardo Felipe Bueno Tierno.

Espero ter contribuído. Sei que o assunto é polêmico e já foi por muitas vezes discutido, mas também acho que ainda existem muitas lacunas na lei, nas ciências, nas terapias, na sociedade que merecem reflexões e lutas pela diminuição das diferenças.

Um grande abraço a todos.
Ana Maria Oliveira
Fono - Brasília

6 comentários:

Anônimo disse...

Se o cargo não for de atendimento direto ao público acho não deve haver nenhum impedimento ao candidato.

Entretanto se houver, dentre as atribuições do cargo, a necessidade de lidar com clientes penso que isso poderia sim ser considerada um impecilho.

Imagino uma situação de alguém com alguma dificuldade na fala lidando com uma pessoa estressada, mau edicada, etc. Imagina como o funcionário será tratado? Como será o desenrolar da situação?

A disfunção na fala não pode não ser uma deficiencia, mas existem ocupações nas quais estas pessoas podem ser melhor aproveitadas.

Abraços!

Anônimo disse...

Concordo com o companheiro !!!

Anônimo disse...

Gostaria de dizer que trata-se, muitas vezes, principalmente em processos seletivos ou concursos de discriminacao, inclusive das quais o candidato se senti humilhado e constrangido. Acredito que para coibir tais abusos deve haver uma amparo legal para decidir com clareza se o candidato pode ou nao se dedicar e concorrer a determinados cargos. Eu, por exemplo classifiquei no Banco do Brasil e me senti constrangido e humilhado quando ocorreu o exame admissional. Inclusive, o medico escreveu no Atestado de Saude Ocupacional que apresento gagueira!

Unknown disse...

Tenho 52 anos e tbem sou gaga em algumas situações, e acho um absurdo que a gagueira não seja enquadrada como deficiência da fala, afinal de contas eu não gaguejo por que quero. A porcaria da justiça brasileira nunca funciona para os menos afortunados, ao passo que um certo político que o Brasil conhece, foi aposentado por incapacidade física por não possuir um dos dedos(que nunca fez falta pra nada) pois governou o pais por longos anos. Conheci um senhor de idade tbem que mamou nas tetas governo por aposentadoria simplesmente por não ter um dos dedos do pé. Ora minha gente, que tal rever este decreto de deficiência ??? FICA A DICA!!

Unknown disse...

Tenho 53 anos e também sou gaga. Eu não acho, tenho certeza que este decreto de deficiências tem de incluir a gagueira, pois como explica que um certo político que governou o pais por longos anos, conseguiu aposentadoria pelo fato de não ter um simples definho. Não que eu queira aposentadoria agora, só quero ter a chance de conseguir um bom emprego, pois sou sempre desclassificada na hora da entrevista, mesmo alertando ao entrevistador

Unknown disse...

Gostaria de saber se um pessoa gaga tem direito a um benefício do estado ou um amparo social