...continuando
Alguns profissionais da área da psicologia dizem que são defeitos nos neurotransmissores. É bem provável que realmente haja um descontrole, sim.
A criança em pouco tempo retém muitas informações. Ela parece uma esponja retendo tudo: aprende a andar, a falar, a brincar, a cantar, a se relacionar com outras pessoas, aprende até mesmo a controlar seus esfíncteres, o seu intestino e o aparelho urinário. Enfim, é muito aprendizado, e é justamente nessa época em que as conexões nervosas se formam com incrível intensidade. A criança está adquirindo a linguagem e o controle da fala. Quer falar coisas para as quais ainda não possui vocabulário suficiente e, ainda, tem pressa de falar. Tudo isso faz com que ela tenha, durante alguns meses, uma gagueira funcional e, é justamente nessa fase, que vêm alguns adultos e cometem o maior erro que se poderia cometer nessa fase. Olham para ela e dizem: “ Ela é gaga!” E a partir daí começam a querer ajudá-la dizendo: “Fale devagar, pense antes de falar, respire fundo, acalme-se”. Ainda há os mais exigentes que dizem: “Fale direito!”
Aquela criança começa a criar a ansiedade. Aquela criança descontraída que apenas queria falar, agora passa a prestar atenção em como falar de forma que os outros aceitem porque, do jeito que ela é, está sendo rejeitada e, cada vez que tiver de falar, surge a ansiedade de desempenho. Esta ansiedade vai tencionando seus músculos e sua laringe (onde estão as cordas vocais), e ela começa a fazer esforço para falar. Surgem os bloqueios, as repetições, a introdução de sons que nada tem a ver com o assunto. A sua face tensa começa a criar gestos para disfarçar a gagueira e, assim, ela vai se repetindo a cada dia. Através dessa forma de exercícios repetitivos vai formando núcleos, “inputs”, formando sua maneira estranha de falar e, assim, marcando sua vida.
Enquanto essa criança vai crescendo, vai repetindo tantas vezes essa fala gaguejada que agora já não pode mais falar como as outras crianças, de forma livre e espontânea, aquilo que lhe vem à mente. Ela está sempre preocupada em como conseguir falar. Ela sabe que as outras crianças têm de ter paciência com ela para esperar até que ela consiga falar. A sua comunicação começa a ser sempre com sofrimento e angústia, sempre à espera da compreensão dos outros, da benevolência dos outros. E, quanto mais sofrida for a sua fala, mais medo vai sendo criado na hora de se comunicar. A sua atenção, que deveria estar voltada para o que gostaria de dizer, quais as brincadeiras que faria com sua fala, agora começa a se voltar para si mesma, e para um modo de como conseguir falar, em como fazer para que sua gagueira passe despercebida, em como fazer para ser igual às outras pessoas.
Tudo isso cria fortes inibições, fortes retrações. A criança já não se expõe a qualquer pessoa, em qualquer lugar, ou em qualquer situação. As repetições dessas situações acabam se tornando verdadeiros exercícios que vão fortalecendo e automatizando, cristalizando essa maneira de falar. Ela deixa de ser espontânea e passa a criar fórmulas para ser aceita, como tornar-se “boazinha” para criar o respeito e a simpatia dos outros ou, ainda, torna-se revoltada e agressiva. Esta é a pessoa que possui a fala gaguejada.
Gagueira sob uma perspectiva que articula linguagem, subjetividade e sociedade.
28 dezembro 2005
Observando um Gago - Parte II
OBSERVANDO UM GAGO
(PARTE II de IV - Hélio Beraldo)
continua...
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Um comentário:
eu pedi para meu filho falar de vagar e respirar firme antes de falar isso so piorou a situação.
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